O ano de 2009 foi, realmente, inesquecível...
Boas festas a todos e até janeiro!
Uma volta nos automóveis antigos e clássicos que marcaram época


Nascida nas pistas americanas, onde rapidamente se distinguiu, a Duesenberg atingiu seu auge nas corridas em 1921 ao alcançar a vitória Le Mans (no GP da França, não nas famosas 24h, que só começaram em 1923), para espanto do público acostumado a ver marcas como Bugatti e Bentley dominando as provas do Velho Continente. A excelência técnica alcançada pelos irmãos Fred e August Duesenberg despertou o interesse do magnata Erret Cord, que adquiriu a firma em 1926 com o propósito de torná-la a marca premium do grupo (como Lincoln e Cadillac, para Ford e GM) e, mais do que isso, fazer dela a produtora dos melhores carros do mundo, destinada a superar Rolls-Royce, Maybach, Isotta-Fraschini e Bugatti, fora as rivais americanas. Se Cord alcançou tamanha façanha, somente os connaisseurs podem dizer, mas a realização de seus devaneios megalomaníacos se materializaria no estupendo modelo J, infelizmente lançado pouco antes do crash de 1929 e cuja produção foi de 481 unidades até 1937. Além do magnífico desenho que fala por si só, os números impressionavam até para modelos de pista da época: seu motor de oito cilindros em linha chegava a 265 hp brutos, capazes de levar o bólido a quase 200 km/h; como se não fosse suficiente, viriam depois as versões sobrealimentadas (SJ e SSJ) de até 400 hp, capazes de conquistar celebridades como Clark Gable, Al Capone e Greta Garbo, além das casas reais da Espanha, Iugoslávia, Romênia e... (pasmem!) da Itália das Isottas e da Inglaterra dos Rolls. Francamente, se fosse possível optar por dar uma volta em qualquer carro já produzido em qualquer época, aí estaria um forte candidato, de preferência na carroceria Speedster, como o J 1931 da foto. Alguém discorda?
Poucos carros representam tão bem um momento histórico de um povo quanto o Cadillac Eldorado o fez pelos americanos. Lançado em 1953, exclusivamente em uma caríssima versão conversível, como modelo mais sofisticado da marca, ele foi posto à venda em um patamar mais acessível a partir do ano seguinte e se tornou o símbolo da pujança, do otimismo e da crença inabalável na própria capacidade técnica tão típicos dos EUA dos anos 50-60, que alcançou o ápice do delírio com o Eldorado Biarritz de 1959. A decadência começou discretamente em 1967, quando foi adotada a plataforma e o sistema de tração dianteira do Oldsmobile Toronado e o Eldo passou a ser uma espécie de muscle-car da marca, longe do conceito inicial, como já comentado aqui. A reação viria na geração seguinte, lançada em 1971, que, apesar de ter mantido a tração dianteira, voltava às origens ao investir novamente no glamour que sempre diferenciou a marca e oferecia novamente a versão conversível, banida desde 1967 da linha Eldorado. Entretanto, os tempos já eram bem diferentes dos anos dourados e, em 1976, os full-size da Cadillac, com seus V8 500 (8.2 litros), eram vistos como um monumental anacronismo em uma América obrigada a enfrentar a dura realidade da derrota no Vietnã e da crise do petróleo. Aquele seria o último ano do Eldorado conversível, mas a versão fechada seguiu carreira até 2002 em uma lenta agonia, a ponto de um exemplar dos anos 80 ter feito papel coadjuvante em Gone in 60 sec como um carro pouco desejável, indigno de ser roubado. Apesar do conversível ter voltado em 1979 em um modelo de porte médio (segundo os padrões da Cadillac), para os fãs da marca o último Eldo fiel ao conceito inicial foi mesmo o conversível 1976 da foto acima, emblematicamente retirado de linha no ano do bicentenário da indepedência americana.
O simpático roadster da foto acima é um Wanderer W25 1936, representante da marca menos conhecida entre as que compõem as quatro argolas do grupo Auto Union, que viraram símbolo da Audi após a sua ressurreição nos anos 60. A Auto Union havia sido criada em 1932, sob supervisão do governo alemão, a partir da fusão das marcas Horch, Audi, Wanderer e DKW para tentar contornar a quebradeira da indústria que sucedeu à débâcle de 1929, ficando a Horch com o segmento de luxo, a Audi com os "emergentes", a DKW com o segmento popular e os veículos da Wanderer com a vocação esportiva. Em um paralelo com a GM americana, algo como as marcas Cadillac, Oldsmobile, Chevrolet e Pontiac, nessa ordem. Facilmente identificáveis por causa da grade em forma de brasão, os Wanderer dos anos 30, com seus motores seis em linha de baixa cilindrada (sempre em torno de 2 litros) foram muito admirados como concorrentes dos Adler Trumpf, mas o parque industrial da empresa, localizado no leste da Saxônia, foi muito castigado pelos bombardeios aliados na II Guerra e não foi reconstruído pelos soviéticos, dando fim à marca.
A inspiração para o post de hoje veio do recém-findo Blue Cloud que, desde 2008, inclui os Passat entre os veículos expostos. Para resumir o interessantíssimo nascimento do eterno médio da Volkswagen, comecemos com a consideração de que ele descende diretamente do Audi 100. A Audi havia sido uma das marcas de luxo do grupo Auto Union até a II Guerra, mas estava hibernada desde então porque seu parque industrial havia ficado do lado soviético da Alemanha ocupada; a Auto Union, por sua vez, havia ressurgido após o conflito usando apenas a marca DKW, cujos veículos de vocação mais popular eram mais adequados para a Europa em reconstrução nos anos 50. Mas a Auto Union enfrentava dificuldades financeiras no final daquela década e acabou adquirida pela Mercedes em 1958. Preocupada com a ascenção da BMW, que vinha agregando prestígio e esportividade em seus sedãs, a marca da estrela decide ressucitar a Audi para se bater com os bávaros na segunda metade dos anos 60, mas desiste do negócio em 1965 e vende a Auto Union para Volks, já com o projeto do Audi 100 engatilhado, inclusive com o motor refrigerado a água projetado por Ludwig Kraus, que daria origem ao nosso conhecido AP; para Wolfsburg, foi um grande negócio, já que seu know-how estava nos motores a ar, que estavam perto do limite do seu desenvolvimento. Se considerarmos que a própria Volkswagen tem origem nos escritórios da Porsche aí estão todas as grandes marcas germânicas sintetizadas em um único carro!
Depois do sucesso do Amazon, que trazia predicados como resistência, segurança e bons resultados nos ralis internacionais, a Volvo resolveu colocar suas fichas no segmento de prestígio a partir dos anos 70, apostando na qualidade dos seus produtos. Como a concorrência estava investindo em grandes cupês esportivos, cuja maior expressão talvez tenha sido o BMW série 6, os suecos resolveram usar a plataforma do sedã 264 e contrataram o renomado estúdio Bertone para produzir artesanalmente seu cupê de prestígio, o 262C. Entretanto, o desafio de dar esportividade às sisudas linhas dos Volvo de então se revelou um desastre estilístico, com uma frente "de caminhão" em conflito com a linha do teto baixa, como nos grandes esportivos, mas revestida em vinil com vidro lateral traseiro pequeno como nas barcas americanas da época, em uma salada de estilos que só durou de 1977 a 1981 com vendas desapontadoras, apesar do acabamento excepcional e do bom desempenho do V6 2.8, que equipou também o DeLorean DMC-12. 
Em toda a história do automóvel, nunca foi muito comum que as fábricas batizassem seus modelos com nomes de barcos (lembro-me agora dos Renault Caravelle e Chevy Corvette), o que aguça a curiosidade sobre a denominação escolhida pela Simca do Brasil para batizar sua perua, que se chamava Marly na França. Luxuosa, sofisticada e espaçosa, ela em nada remetia à rústica embarcação usada por pescadores no nordeste, mas acabou ganhando esse nome porque o logotipo na porta dianteira - que já existia na Marly original - lembra muito uma jangada e acabou saindo mais barato para a fábrica mudar o nome do que o seu desenho; a razão para que houvesse o tal logotipo na Marly seria associá-la aos veleiros da Riviera Francesa, visando reforçar a imagem de sofisticação do modelo. O exemplar 1964 da foto repousa hoje em uma das melhores coleções do Brasil e representa um ano de transição para a Jangada, que manteve as linhas originais das pioneiras de 62-63, mas estreava o motor Tufão junto com os sedãs, que haviam sofrido uma leve reestilização que se estenderia às peruas a partir de 1965.


A foto acima foi tirada em Münster, na Alemanha, onde ocorre um dos maiores encontros de veículos Tatra da Europa. Pouco conhecida no Brasil, a marca tcheca é uma das mais antigas do mundo e ficou famosa entre os amantes do Volkswagen porque o modelo T-87 (em segundo plano) era muito admirado por Hitler e teria servido de inspiração para o projeto do Prof. Porsche, como já foi contado na história do Tatraplan T-600, que aparece em primeiro plano na foto. A razão do post, no entanto, é que esses dois modelos poderiam perfeitamente ter sido fotografados no Brasil, já que há por aqui um T-600, que está em uma coleção particular, e um T-87 que, até onde se sabe, ainda faz parte do acervo do Museu da Ulbra, fechado recentemente. Na opinião deste que vos escreve, trata-se de veículos de alto valor histórico por representarem um ramo importante da engenharia automotiva - que acabou "podado" mais por questões políticas do que técnicas, já que a Tatra foi uma das grandes vítimas da burocracia soviética - ao qual deveria ser dada maior relevância nas coleções brasileiras. Alguém sabe sobre o paradeiro desses carros ou se há mais deles por aqui?

Elas ficaram famosas no Lamborghini Miura e foram reeditadas no Lancia Stratos e no DeLorean para suavizar o desenho da traseira, já que seus habitáculos terminavam abruptamente em um vidrinho vertical, atrás do qual ficava o motorzão (o superlativo só é aplicável ao Lambo...). Mas, embora originais, não parecem fazer muito sentido neste Mustang Mach 1 1970, não é verdade? A foto é do Brazil Classics 2006.
De todos os automóveis já produzidos no mundo, provavelmente o único que merece o título de "incomparável" seja a Bugatti Tipo 41 Royale. Superlativa em tudo, a começar pelo motor de oito cilindros em linha e 12.7 litros (!) com 300 hp brutos, passando pelos mais de 6m de comprimento com 2m entre o radiador e o parabrisa (o maior automóvel de passeio já construído, excetuando-se as limousines) e pelas rodas aro 24 pol. com os discos centrais em prata genuína, ela é vista como a expressão máxima da cultura automotiva, uma escultura mecânica com status - e preço - de obra de arte de primeira grandeza. Apenas seis exemplares foram construídos porque Ettore Bugatti calculou mal o gosto dos reis e imperadores da época e vendeu apenas três exemplares, nenhum deles para a alta nobreza. Sempre que uma Royale é posta à venda atualmente, há um verdadeiro alvoroço nas altas rodas que amam o luxo e as belas artes, sendo que a unidade mais valiosa e admirada é o Coupé Napoleon 1929 da foto acima, que se encontra no museu dedicado à marca em Mulhouse e traz características marcantes de todas as Bugatti, como grade em forma de ferradura e eixo dianteiro à frente do radiador. Como absolutamente tudo já foi escrito sobre esses fabulosos veículos, cabe ao Antigomóveis apenas esta pequena homenagem ao passo mais ousado da história da engenharia automotiva. 


