Mesmo sendo um entusiasta dos carros antigos nacionais, eu nunca havia dado muita bola para o Puma; muito da imagem um tanto negativa que o pequeno esportivo ainda tem em certos grupos de colecionadores se deve ao péssimo estado em que a maioria deles se encontra, quase invariavelmente mal restaurados, mal conservados ou, pior, totalmente descaracterizados. Eu sabia que esse não seria o caso quando, em 2005, o Ronaldo Fachin elegeu um Puma GTE 1971 para sua coleção que, no currículo, tem um Fusca 1950 premiado no Brazil Classics 2004. Quando vi o desafio que tinha pela frente, no entanto, fiquei desanimado: do carro original, sobraram apenas a carcaça, os bancos e o raro console central; parado por anos a fio no subúrbio do Rio de Janeiro, ele era cheio de remendos e quebra-galhos, mas tinha a virtude de ser o mais desejável dos Puma-VW, o último com as linhas originais de Anísio Campos, com a traseira curtinha e sinaleiras debaixo dos faróis, e o primeiro a ter freios a disco de série. Quase dois anos e muitas dores de cabeça depois, ele brilhava como novo na sua nova cor, um cinza-chumbo metálico muito próximo ao do Dodge Dart daquele ano, já que a Puma não tinha catálogo de cores próprias e o dono podia optar por qualquer uma disponível entre os fabricantes. A mecânica, também tinindo de nova, seguia a receita do Kit Puma da época, com pistões forjados, cilindrada aumentada para 1.7 litro, comando Engle e duas Weber 44 que levam o esportivo de pouco mais de 600 kg a uns 115 cv líquidos, uma ótima relação peso-potência. O charme ficou por conta dos filtros de ar da Italmagnésio autênticos de época, que parecem ter sido guardados para serem usados no Puma. Fui escalado para descer com o bichinho pela Rodovia dos Imigrantes para a sua estréia no
encontro de Santos de 2007 - no qual, obviamen-te, ele foi premiado. O ambiente esportivo, a ótima posição de dirigir e os bancos envolventes já eram conhecidos de outros Pumas, mas é na estrada que ele surpreende quem espera pouco mais do que um Fusca com roupa de ginástica. Com exceção da posição dos pedais e do plec-plec-plec das batidas de válvula, ele em nada lembra o pacato carro de passeio do qual derivou e oferece ao motorista uma autêntica experiência de pilotar um puro-sangue: motor nervoso, subida de giros rapisíssima, um coice de potência acima das 3500 RPM, suspensão firme e estabilidade exemplar - a Puma é citada em vários livros internacionais sobre a VW como a empresa que conseguiu o melhor acerto de suspensão para modelos "a ar". A velocidade final do bólido? Bem, digamos que eu tenha ficado bem à margem da lei na Imigrantes, mas o Júlio, filho do Ronaldo, já me disse que deixou para trás um atônito Focus Ghia a mais de 200 km/h...
Sucesso de público e crítica no Brasil e no exterior, ele foi vítima da própria empresa que o criou, tendo sido descaracterizado e amansado com o tempo até se transformar em mais um fora-de-série nacional charmoso, feito mais para quem buscava um visual exclusivo do que para os amantes dos carros-esporte. Seus criadores - Jorge Lettry, Anísio Campos, Marinho, entre outros - foram deixando a Puma na medida que ela ia se desviando de sua proposta inicial até se transformar em uma empresa problemática e endividada que abriu falência em 1990 após várias mudanças de dono e tentativas de produzir até caminhões. Mas os anos de ouro da indústria brasileira estão muito bem preservados e documentados por este belo felino que, junto com com outros exemplares dos mais antigos, vem ganhando lugar em algumas das melhores coleções do Brasil e é saudado no exterior como um dos melhores e mais divertidos
pocket-rockets já criados.