segunda-feira, 27 de outubro de 2008

AO VOLANTE - IV: VOLKSWAGEN SEDAN 1950

No final de 1947, ainda com a pro-dução limi-tada pelas restrições da combali-da econo-mia alemã do pós-guerra, a Volkswagen começou a exportar seu produto para a Holanda. A aceitação do carrinho foi tão boa que logo surgiu uma versão de acabamento mais elaborado que mantinha o motor 1.1 do modelo padrão e foi designada como De Luxe ou Export, dependendo da literatura - o termo Export provoca alguma confusão, já que esse padrão de acabamento era oferecido também na Alemanha -, destinada a conquistar o resto da Europa Ocidental e, posteriormente, outros mercados de exportação. Tantos bons artigos já foram escritos sobre o nascimento do Fusca, concebido por Ferdinand Porsche no ambiente de turbulência política da Alemanha nazista, que este blog se limita a indicar a leitura do excelente "Eu amo Fusca", do Engenheiro Alexander Gromow, que também assina uma coluna sobre o tema no Portal Maxicar. No Brasil, há notícia de pela menos dois modelos 1949 nas mãos de colecionadores, mas, oficialmente, ele chegou por aqui em 1950, na versão Export, importado pela Brasmotor (que também era a responsável pela distribuição dos veículos do grupo Chrysler), caso do exemplar Mittelbraun (Marrom Médio) premiado no Brazil Classics 2004 e mantido em estado de 0 km pelo meu amigo Ronaldo Fachin. O nível de excelência alcançado na restauração - que contou, inclusive, com a orientação do museu da fábrica em Wolfsburg - permite uma verdadeira viagem no tempo a bordo do carrinho, mesmo quando comparado a Fuscas mais novos, como o meu 1300 1969. Além das diferenças no desenho da carroceria, como a janela traseira dividida (Bretzel, em alemão) e o pára-brisa menor, o que chama a atenção nesse pioneiro é o capricho da Volkswagen no acabamento, com tecidos de ótima qualidade e muito agradáveis ao toque, embora muito mais sujeitos a desgaste do que o material de plástico emborrachado dos Fuscas nacionais. O painel conta com dois grandes mostradores centrais, um com ve-locímetro, odômetro e luzes-espia e o outro com um relógio de horas a corda, além de dois porta-luvas sem tampa, um em cada extremidade. Não há marcador de combustível e a torneirinha da reserva do tanque fica ao alcance do pé do motorista; aquecedor era equipamento padrão. Por fora, nada de cromados em volta dos vidros nem de quebra-ventos ou abertura das janelas traseiras, sofisticações que foram acrescentadas no decorrer dos anos; frisos e pára-choques vincados, portas e tampa do motor de desenho diferente, as indefectíveis "bananinhas" e rodas aro 16 ajudam a diferenciar o carrinho (nas fotos, ele ainda está com as rodas aro 15, já que as 16 estavam em restauração). Por isso mesmo, os primeiros Bretzel são muito valorizados, já que carregam muito da concepção inicial de Porsche. Dirigindo-o, mesmo quem está acostumado com o Fusca sente o volante pesado, a falta de estabilidade e a imprecisão nas rodas dianteiras, principalmente acima de 60 km/h, já que não havia ainda o amortecedor de direção; além disso, os amortecedores eram do tipo "bracinho", de modo que o carro pula mais do que seus irmãos mais novos. O escapamento único lhe dá um ruído semelhante ao das primeiras Kombis, mas o interior da cabine não chega a ser significativamente mais ruidoso do que nos Fuscas mais recentes. Além da estabilidade deficiente e da falta de potência por causa do motor menor, outro detalhe que chama a atenção é a má visibilidade, culpa das pequenas janelas traseiras e dos minúsculos retrovisores (o externo era acessório), o que só serve para aumentar a emoção e a reverência ao dirigir esse pioneiro, objeto de desejo de dez entre dez apaixonados pelo maior ícone sobre rodas já criado. Quem pensa que o veterano está aposentado se engana: em 2006 ele encarou a Fernão Dias de BH até São Paulo sem nenhum problema, confirmando os comentários sobre o post aí embaixo, que defendem que carro antigo tem que rodar.

15 comentários:

Felipão disse...

Aeeeee

Essa pausa nas postagens foi compensada por mais essa belíssima matéria...

E que Sedanzinho... De arrancar suspiros...

E somente o olhar de um especialista como vc, para descrever tantos detalhes, que as vezes passam desapercebidos por uma admirador menos atento...

Grande Luís

Anônimo disse...

Luis, parabéns pelo artigo! Além de falar com muita propriedade você conhece bem a história deste específico carro, cuja restauração foi feita com bastante carinho e atenção aos detalhes. Depois te mando fotos com os aros 16.
Um abraço,
Julio

Portal Maxicar disse...

Disse tudo! Parabéns pelo belo texto.
Sobre os 1949 citados na matéria, acredito que um deles pertença ao simpático Sr. Antonino aí de BH. Há muito tempo que não o vejo. Da última vez que o encontrei ele havia acabado de comprar um 1949 encontrado em uma fazenda, servindo de galinheiro. Ia começar a restauração.

Luís Augusto disse...

Exatamente, um dos 49 conhecidos está com o Antonino e o outro está em Brasília aguardando restauração. Aparentemente são modelos destinados inicialmente aos EUA, mas, como não obtiveram êxito lá (só duas unidades foram vendidas naquele ano), o resto do lote foi encaminhado de maneira não-oficial para a América do Sul.

Gustavo disse...

Luis, sensacional matéria como sempre. Como voce sabe tenho um 67. Queria saber mais sobre esse modelo, sabe onde posso encontrar informações?
Sei que essse ano foi o primeiro que sairam os 1300 de 12v , confere?

Luís Augusto disse...

Grande Gustavo, obrigado pelos elogios. Sobre o 67, o que eu sei é que houve duas séries, ambas 1300: uma primeira de 6V e a segunda já com 12V. Os 67 trouxeram vários pequenos aperfeiçoamentos em relação aos modelos até 66, como vigia traseiro maior, rodas com furos para ventilação dos freios, comando do farol alto na alavanca de seta a trinco diferente na tampa do motor e limpadores de pára-brisa parando à esquerda. Em relação às alterações que viriam no 68 e 69, ele ainda tinha retrovisores de pino de porta (vendido como acessório nas concessionárias; de fábrica ele vinha sem retrovisores externos) e lubrificação diferente da caixa de direção (ela passou a ser lubrificada com graxa a partir de 68). São as características que me lembro agora. Chegando em casa vou dar uma olhada e, se faltar alguma importante, eu te falo.

Anônimo disse...

Pois é caro Malta,
Em primeiro lugar o meu agradecimento pela divulgação de meu primeiro livro “EU AMO FUSCA – A história brasileira do carro mais popular do mundo” (dados para quem se interessar pelo conteúdo no link: http://www.ripress.com.br/eaf1.htm) e lembro a seus leitores que somos, na verdade, colegas de Portal MAXICAR, pois você também tem a sua competente coluna lá:
http://www.maxicar.com.br/old/malta/colunista_lamalta.asp.
A sua matéria está muito interessante e daria motivos para longos papos regados ao “sagrado suco da cevada temperado com lúpulo e malte”, mas quem sabe isto ainda se concretiza um dia, quem sabe ai na Savassi em Beagá ou aqui em Sampa na Vila Madalena...
Tocando a ponta o iceberg, o “Brezel” vem de um tipo de pão que leva este nome, tem o formato aproximado de um 8 deitado e foi inventado por frades alemães para registrar o ato de contrição da época. Antes de se usar por as duas mãos em oração os monges abraçavam o corpo tocando o ombro esquerdo com a mão direita e vice versa. Olhando de frente os braços desenvolviam o formato que foi perenizado pelo pão que foi chamado de “Brezel” depois muito apreciado em festas tipo Oktoberfest (leva sal, o que aumenta a sede...) e cedeu o seu nome ao Fusca antigo de duas janelinhas. Um dos mais antigos clubes de Fuscas da Alemanha é o Brezelfensterverein do qual sou sócio, por “acaso”...
Pois é, o que é que isto tem com a história do Fusca, bem não sei, mas seguramente serve para o departamento especial de “cultura inútil”...
Reitero meus agradecimentos e envio meus parabéns por seu trabalho
Alexander Gromow
a.gromow@hotmail.com

Luís Augusto disse...

Gromow, muito obrigado pelo comentário. Realmente eu não sabia da origem do Brezel (inclusive, quando estive em Munique, comi o tal pão na Hofbräu e achei que seu nome fosse Pretzel, em alusão ao salgado americano). Quanto ao apelido alemão do primeiro Fusca, apesar de saber falar um pouco da língua pátria do Sedan, me acostumei a pensar que era sinônimo de split em alemão. Vivendo e aprendendo...
Mais uma vez, muito obrigado e seja sempre bem-vindo!

Chico Rulez! disse...

Como diria Obelix: esses Fachin são uns loucos! PERFECCIONISTAS DOENTES COM DETALHES MÍNIMOS com esse marronzinho. hahahahahaha

Não é à toa que é o VW mais legal que eu já vi (ainda não vi o Cabriolet original Hammann, snme, que tem no Brasil).

Luís Augusto disse...

Chico, concordo com a observação sobre o perfeccionismo do clã dos Fachin! Não conheço o cabriolet Hamann (isso não é nome de uma preparadora de BMW?). Existem os cabriolets da Karmann, de quatro lugares, e os Herbmüller, muitíssimo mais raros, de dois. Os da Karmann podem ser vistos por aí (havia um no encontro de Santos de 2007), mas os Herbmüller originais não existem no Brasil.

Anônimo disse...

Obrigado pelos elogios! Fomos "chatos" durante as restaurações, sempre seguindo a máxima de que "se é pra fazer tem que fazer direito" hehehe.
Abraços,
Julio

Chico Rulez! disse...

Troquei as bolas bonito. É do Hebmüller que tou falando. E tem por aqui sim, ó:
http://www.flickr.com/photos/rgolgatti/1413320169/.

Chico Rulez! disse...

Pesquisei mais um pouco e vi algumas réplicas, agora fiquei na dúvida.

Luís Augusto disse...

Chico, esse suposto Herbmüller estava em Araxá em 2008 e é apenas uma réplica bem meia-boca (ou você acha que o dono de um autêntico Herbmüller colaria um adesivo desse na porta?) Existe uma outra réplica desse modelo em São Paulo, extremamente bem-feita, mas, ainda assim, uma réplica. Só não me pergunte como os donos conseguiram a placa preta...

Teté M. Jorge disse...

Que postagem fantástica! Como eu aprendo vindo aqui.
Já indiquei seu site pro mano que é chegado em carros antigos. Ele já teve um volvo.

A propósito, Luis, o seu é o que estampa lindamente este blog?

Beijos.